Transfusão Cardíaca
Chega uma hora que o coração cansa. Cansa de sofrer, cansa de chorar, cansa até das alegrias e de diversas outras emoções. Neste momento, só um coração novo para reavivar as alegrias. Os médicos recomendam repouso absoluto após uma cirurgia complicada e depois da recuperação, nada de estripulias. Muda-se o modo de vida, a alimentação e passa-se a fazer exercícios maneiros e sob supervisão médica. Um caso clássico desse tipo de cirurgia aconteceu com um pacato Ford Ka 2001 vermelho sangue, de propriedade de João S. W. Pachêco Filho, de 53 anos, ou simplesmente Pachêco. No caso desse veículo, a transfusão foi feita e as recomendações (indicadas a humanos, que fique claro) infelizmente, teve de ser seguida. Não pelo fato de não se poder acelerar o Ka, mas pela saúde de seu piloto.

Pachêco participou da Copa Corsa desde 1995 e com sua extinção para a criação da Copa Turismo, viu num inusitado Ford Ka a oportunidade perfeita para ingressar nesta competitiva categoria do automobilismo nacional com uma carroceria nova e diferente no meio automobilístico. Com uma carroceria de Ka e um motor 1.6L derivado de uma antiga pick-up Corsa de sua propriedade, Pachêco encaminhou o motor à oficina do Zezão, localizada dentro do autódromo de Brasília. Lá o cabeçote GM 1.6L foi trabalhado para uma maior taxa de compressão e recebeu tuchos mecânicos no lugar dos hidráulicos originais e um belo trabalho de fluxo para fazer o motor respirar bem. Após todo o trabalho realizado o saudável GM rendeu 141 cvs e foi posicionado no cofre do motor do Ka com o uso de chapas de 8mm. “Eu mesmo fiz essa adaptação e já deixei o cofre pronto para poder receber até mesmo um motor 2.0L!” – diz Pachêco.

O Ford Ka vermelho fora depenado por inteiro. Perdeu forrações, bancos, painel, volante... enfim, ficou “na casca”. Todo um aparato de segurança foi montando no Ka para garantir a integridade do piloto em caso de qualquer acidente. Uma RollCage (também conhecida como gaiola de proteção) foi montada apoiando-se nos principais pontos de sustentação do veículo. Os novos “passageiros” do Ka são um extintor de pó químico que pode ser acionado tanto interna quanto externamente por meio de chaves gerais e uma bomba de combustível. O piloto é acolhido por um banco em formato de concha fixo forrado em couro com seu nome bordado e fica muito bem localizado. O interior do veículo é pintado em um tom mais escuro e metálico que o vermelho ostentado pela carroceria e ostenta ainda um volante de três raios revestido em couro para uma melhor pegada. Logo ao lado está a manopla de câmbio que foi elevada para facilitar e agilizar a troca de marchas. Abaixo do trambulador, uma caixa em alumínio comporta duas luzes espias, chave geral da eletricidade, acionador interno do extintor e dois botões do tipo caça que acionam a bomba de combustível e o limpador de pára-brisa juntamente com os faróis. Como o painel original do Ford Ka foi eliminado, Pachêco tratou logo de re-organizar o quadro de instrumentos, aproveitando alguns itens do painel original do GM Corsa. No centro estão o conta-giros AutoGauge com shift-ligth embutido e o manômetro de pressão do óleo da AutoMeter, linha Sport Comp. Na lateral direita avista-se o velocímetro e na esquerda o manômetro da temperatura do motor herdados do mesmo doador do “coração”. Este painel também conta com mais três luzes espiãs que sempre alertam o piloto caso algo fuja do planejado e informam sobre o contato de um dos acionadores da bomba de combustível ou dos faróis. Algumas destas espias do painel são repetidoras daquelas localizadas abaixo do trambulador.

Após um processo de revitalização, o Ford Ka de Pachêco ficou mais “musculoso” para poder encarar com facilidade as curvas do autódromo Nelson Piquet. As famosas rodas Cruz-de-Malta em aro 13” foram calçadas com pneus Pirelli P-Zero 175/60 e contribuem bastante para a estabilidade. Em contrapartida, essas rodas possuem o off-set muito positivo, jogando as bordas da roda para fora dos pára-lamas. Com isso, os acabamentos plásticos dos pára-lamas e as extremidades do pára-choque traseiro tiveram que ser cortadas, tanto para acomodarem o novo conjunto de rodagem, como para ajudar na extração do ar que passa por debaixo do veículo. Alargadores laterais entraram em cena e um spoiler dianteiro faz as vezes de captador de ar no pára-choque dianteiro, que ainda recebeu furos no porta-placa para ajudar na refrigeração do motor. No pára-choque traseiro avista-se ainda um singelo extrator de ar que cumpre muito bem sua função.

A suspensão travada na traseira com amortecedores re-trabalhados com 300Lbs de pressão na dianteira, juntamente com molas especialmente feitas por Pachêco, aliados ao curto entre-eixos do (agora) notável Ford, deixam o veículo sempre na mão mesmo em curvas mais acentuadas. A frenagem é garantida por um jogo de discos de freios ventilados e perfurados, prensado por pinças Willwood e pastilhas de competição na dianteira. Os freios traseiros são perfurados e contam com pinças AP inglesas, derivadas dos antigos F3 e pastilhas de competição. É praticamente um estanco!

Infelizmente nunca foi possível ver o Ford Ka nas pistas. Apesar de ter sido montado com todo carinho para esta finalidade, Pachêco teve um problema de coluna que o impossibilitou de guiar seu Ka em competições. “Montei esse carro a uns dois anos e nunca coloquei ele nas pistas... Já me chamaram pra correr no autódromo com o Ford na Copa Turismo apenas para umas voltas, mas fico receoso”. – diz saudoso, Pachêco. Felizmente o transplante cardíaco é possível, mas o de coluna ainda não. Esperamos que a saúde deste piloto se re-estabeleça e que possamos vê-lo muitas e muitas vezes dando trabalho para outros pilotos desta categoria.
Ficha Técnica

Marca: Ford

Veículo: Ka

Ano:
2001

Motor:
GM 1.6L 8válvulas, cabeçote com trabalho de fluxo, tuxos mecânicos, maior taxa de compressão – 141 cvs.

Embreagem/Câmbio: Original GM 1.6L.

Suspensão: Dianteira – Amortecedores retrabalhados com 300lbs de pressão e molas com maior carga / Traseira - Travada.

Freios:
Dianteiros – Disco ventilado com pinças Willwood e pastilhas de competição / Traseiro – Disco sólido com pinças AP (inglesas) e pastilhas de competição.

Rodas/Pneus:
6x13” calçadas com pneus Pirelli P-Zero 175/60-13”.

Exterior:
Pára-lamas alargados, spoiler direcionador dianteiro, extrator traseiro, recorte nos pára-lamas traseiros.

Interior:
RollCage (gaiola de proteção), volante de três pontas, banco concha, velocímetro e termômetro de água do GM Corsa, Cota-Giros Auto-Gauge, manômetro de pressão do óleo Auto Metter, trambulador elevado, pedaleiras de alumínio, extintor, bomba de combustível, bateria e módulo da injeção eletrônica.

 

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Texto: Rafael Souza | Fotos: Rodrigo Lira
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